Por: Juliana Martins Teixeira Marques Cordeiro

O superendividamento, termo atribuído situação de endividamento excessivo, é um fenômeno em ascensão no Brasil, que vem acarretando a incapacidade de diversos consumidores honrarem suas dívidas sem comprometerem suas necessidades básicas e sua dignidade.
No ano de 2021, diante do avanço do número de pessoas endividadas no Brasil, foi editada a Lei Federal n. 14.181/2021, que entrou em vigor no dia 1º de julho daquele ano. A edição da lei se deu em meio a um cenário de grande crise econômica, deflagrada especialmente após a pandemia do Novo Coronavírus, quando este aumento do número pessoas endividadas ganhava maior repercussão, porém, a preocupação com os consumidores superendividados já estava em pauta muitos anos antes. Nos idos de 2004, estudantes de pós-graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, sob a orientação da Professora Dra. Claudia Lima Marques, desenvolveram pesquisas que já refletiam um cenário preocupante, e criaram propostas para o tratamento do superendividamento,que, futuramente, deram origem ao Projeto de Lei n. 283/2012 e, consequentemente, à Lei Federal n. 14.181/2021.
Promovendo alterações ao Código de Defesa do Consumidor (Lei Federal n. 8.078/1990) e ao Estatuto da Pessoa Idosa (Lei Federal n. 10.741/2003), a Lei n. 14.181/2021 veio, assim, trazer maior disciplina à concessão de crédito ao consumidor, e criar mecanismos de prevenção e tratamento do superendividamento, inserindo o crédito responsável e a educação financeira como direitos básicos do consumidor, e determinando que as instituições financeiras e fornecedoras de crédito fossem mais criteriosas na concessão de empréstimos à pessoas idosas.
Dentre os principais direitos trazidos pela Lei n. 14.181/2021, como forma de prevenção e solução do superendividamento, podemos citar a obtenção de informações claras sobre os custos do crédito, como juros, taxas e encargos, bem como o direito de o consumidor não ser alvo de práticas de marketing que possam levar ao endividamento irresponsável, como anúncios que omitam os riscos do crédito.Passou a ser assegurado,ainda, o direito de participar de programas e campanhas de educação financeira, fornecidos por empresas e pelo poder público, e de buscar renegociação de suas dívidas junto às próprias fornecedoras,aos órgãos de proteção ao consumidor e através de núcleos de conciliação e mediação de conflitos, que devem ser instituídos, conforme determinação da lei.

Mas, inegavelmente, a medida que mais se destacou, com o advento da Lei do Superendividamento, foi o direito de o consumidor requerera repactuação de suas dívidas perante o Judiciário, na hipótese de ter a tentativa inicial de renegociação frustrada. Como passou a ser previsto no artigo 104-A do Código de Defesa do Consumidor, o processo de repactuação de dívidas pode ser proposto pelo próprio consumidor superendividado, junto ao Poder Judiciário, requerendo a renegociação das dívidas, uma vez comprovado que sua situação não se deu por má-fé do mesmo, ou seja, que o consumidor não buscou angariar crédito ou realizar compras a prazo já com o propósito de não as quitar.
O processo de repactuação de dívidas tem por objetivo a realização de uma audiência conciliatória, a ser realizada perante o juiz da causa ou por conciliador credenciado, com a presença de todos os credores do consumidor endividado. Na audiência, o juiz ou conciliador tentará facilitar um acordo entre o consumidor e seus credores, buscando a melhor solução para a repactuação das dívidas. Mesmo que não haja acordona audiência de conciliação, o juiz pode determinar a repactuação judicial das dívidas, compulsoriamente, estabelecendo condições de pagamento mais favoráveis para o consumidor, no prazo de até cinco anos.
A ação de repactuação de dívidas configura, portanto, um importante instrumento, que visa solucionar o problema do consumidor em situação de superendividamento, evitando que este seja sobrecarregado com dívidas impagáveis, que acarretam problemas não apenas de ordem pessoal, mas também social.

Juliana Martins Teixeira Marques Cordeiro é membro do IBCMAS, advogada e professora universitária, mestranda em Direito, na área de Meios Alternativos de Solução de Conflitos e pós-graduanda em Direito do Consumidor.

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